Zé Trindade (pseudônimo do baiano Milton da Silva Bitencourt) encarnando seu personagem, se contrapunha totalmente à imagem do sujeito ingênuo, rural, de espírito puro e boa praça de Mazzaropi na sua emblemática interpretação do Jeca Tatu.
Zé Trindade e Grande Otelo incorporavam os malandros urbanos. Rapineiros, loquazes, ladinos. Cheios de artimanhas, ases nas mangas e um discurso apropriado para safarem-se em cada ocasião: perigo, fuga ou desembaraço. De forma menos romântica, mais próxima do capitalismo selvático (já que o tipo surgia justamente no Brasil pré-industrializado de JK) realidade que chegava com a indústria automobilística ao país. Zé Trindade personificava um sujeito ensebado, cafageste e trambiqueiro. Um pilantra de cacife muito baixo, sempre disposto a aplicar pequenos golpes nos otários de plantão - do jogo de chapinha às loterias (o jogo de chapinha consiste em adivinhar sob aposta onde está escondida uma bola de miolo de pão entre três tampas de garrafa dispostas, usualmente a bolinha está na mão do malandro que faz o jogo).
Assistiraos filmes em P&B protagonizados por Zé Trindade, Grande Otelo (parceiro frequente dele), Oscarito, Anquito, Costinha e muitos outros que não sejam debilóides sem graça como Renato Aragão e Dedé Santana - é uma delícia.
E pra quem pensa que as chanchadas eram produções ingênuas: Ouvidos atentos e olhos abertos que o subtexto é uma atração à parte. Vale tudo: Da crítica sutil, ás vezes nem tanto, ao regime e aos costumes de época às maiores demonstrações de sexismo e picardia. Tudo conduzido sem apelação excessiva. Bueno! Esse era um tempo quando haviam ótimos roteiristas,ás pencas. Com verve, imaginação e vocabulário. Assim os "heróis" podiam caprichar no "Chalalá" sem dar vexame. Depois veio a ditadura militar, o AI/5 e a televisão aos poucos emburreceu levando ao desterro nossos ídolos: Um certo Coronel Odorico, Shazan e Sherife, Macunaíma, Zé Trindade, Azambuja (personagem do genial Chico Anísio) e tantos mais que davam a tônica do heroísmo "nacionár!"