Ilustração: Jorge Cabeleira - Arquivo jornal VAIA
Malinoso! Era com este adjetivo inventado que minha tia avó Branca chamava minha atenção. Nossas diferenças começaram quando do alto dos meus sete anos lhe preguei um susto. Acontece que a velhinha, muito pia, observava assiduamente o costume católico de rezar o terço ao final das tardes. Numa dessas, escondido dentro de um enorme cesto de vime posto ao lado da cômoda do quarto, esperei minha tia ajoelhar-se ao pé do oratório, acender uma vela à Imaculada Conceição e iniciar o balbucio do credo. Num repente irrompi pela tampa do balaio gritando um búúú! Ao que minha velha tia reagiu caindo sentada. Note-se o fato de que eu estava usando seus óculos de grau. Óculos foram muito tempo objeto de meu desejo, um estranho fetiche infantil. Fugi às carreiras já sabedor da sova quando a velha desse queixa, minha mãe não perdoava. Seguiu-se atrás de mim o brado dela em desagravo: Malinoso!
(...) Seu Osmar fora trabalhador braçal contratado da antiga linha férrea federal a RFFSA. Edson, seu filho mais moço e eu fomos colegas desde a sexta série primária. Jogávamos futebol e tentávamos a sorte com as gurias da escola. Os resultados eram pífios. Nas tardes de domingo sob a extensa parreira em casa de seu Osmar eu escutava com delícia seus causos. Ele costumava designar os personagens velhacos das suas estórias como “alcaides”. Título árabe equivalente ao cargo de prefeito atual, em que pese tais tipos, os “alcaides”, na prosa de seu Osmar merecerem a antipatia da comunidade.
Mais tarde, moço feito, trabalhei na estação rodoviária de Cachoeira do Sul, lá conheci Francisco, o Chico da revistaria que tornou-se amigo e parceiro de canastra. Por ocasião de algum debate sobre política meu camarada Chico sapecava o verbo usurpar, quando não o adjetivo usurpador. No falar de Chico o Brasil mais parecia uma monarquia constitucional. Embora Chico fosse um dos muitos gaúchos saudosos da era Vargas.
Olívio Dutra durante a campanha para o governo do estado do Rio Grande do Sul e depois, eleito, adorava esbanjar o verbo espraiar. Espraiou-se enfim galgando o cargo de ministro do governo Lula d’onde se viu “espraiado” de volta à província de São Pedro – antigo nome do estado.
O ex-presidente Jânio Quadros purista da língua. Amigo confesso da vernaculidade, etanóico respeitável e gramático pertinaz não admitia escorregões na sintaxe do idioma luso. Seu intróito costumeiro era um advérbio de modo: Evidentemente.
(...) Pessoas de todas as classes sociais elegem termos com finalidade de em determinado ponto da conversa entremearem essas palavras, muita vez independendo sua pertinência ao tema da conversa. De uma forma ou outra freqüentemente nos utilizamos desses jargões (às vezes corporativos) como forma de distinção. Também para fugir ao lugar comum coloquial colorindo o discurso. Nessa eleição das palavras, eu, brasileiro, mestiço, sentimental – quiçá piegas. Elegi duas bem simples. Correntes na boca do povo. Fáceis de encontrar nas artes, freqüentes no dia a dia. Por vezes maltratadas super exploradas, aviltadas. São elas: Amor e esperança. Amor meu eleito dileto, qualquer que seja vale a pena. Assim afirmam os poetas e concordo. Mesmo quando desgastado, cansado, e melancolicamente platônico. A palavra esperança escolhi porque sem esperança não há amor. Tornando impossível qualquer mínima chance para que exista um ínfimo momento de felicidade.
(...) Seu Osmar fora trabalhador braçal contratado da antiga linha férrea federal a RFFSA. Edson, seu filho mais moço e eu fomos colegas desde a sexta série primária. Jogávamos futebol e tentávamos a sorte com as gurias da escola. Os resultados eram pífios. Nas tardes de domingo sob a extensa parreira em casa de seu Osmar eu escutava com delícia seus causos. Ele costumava designar os personagens velhacos das suas estórias como “alcaides”. Título árabe equivalente ao cargo de prefeito atual, em que pese tais tipos, os “alcaides”, na prosa de seu Osmar merecerem a antipatia da comunidade.
Mais tarde, moço feito, trabalhei na estação rodoviária de Cachoeira do Sul, lá conheci Francisco, o Chico da revistaria que tornou-se amigo e parceiro de canastra. Por ocasião de algum debate sobre política meu camarada Chico sapecava o verbo usurpar, quando não o adjetivo usurpador. No falar de Chico o Brasil mais parecia uma monarquia constitucional. Embora Chico fosse um dos muitos gaúchos saudosos da era Vargas.
Olívio Dutra durante a campanha para o governo do estado do Rio Grande do Sul e depois, eleito, adorava esbanjar o verbo espraiar. Espraiou-se enfim galgando o cargo de ministro do governo Lula d’onde se viu “espraiado” de volta à província de São Pedro – antigo nome do estado.
O ex-presidente Jânio Quadros purista da língua. Amigo confesso da vernaculidade, etanóico respeitável e gramático pertinaz não admitia escorregões na sintaxe do idioma luso. Seu intróito costumeiro era um advérbio de modo: Evidentemente.
(...) Pessoas de todas as classes sociais elegem termos com finalidade de em determinado ponto da conversa entremearem essas palavras, muita vez independendo sua pertinência ao tema da conversa. De uma forma ou outra freqüentemente nos utilizamos desses jargões (às vezes corporativos) como forma de distinção. Também para fugir ao lugar comum coloquial colorindo o discurso. Nessa eleição das palavras, eu, brasileiro, mestiço, sentimental – quiçá piegas. Elegi duas bem simples. Correntes na boca do povo. Fáceis de encontrar nas artes, freqüentes no dia a dia. Por vezes maltratadas super exploradas, aviltadas. São elas: Amor e esperança. Amor meu eleito dileto, qualquer que seja vale a pena. Assim afirmam os poetas e concordo. Mesmo quando desgastado, cansado, e melancolicamente platônico. A palavra esperança escolhi porque sem esperança não há amor. Tornando impossível qualquer mínima chance para que exista um ínfimo momento de felicidade.
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