Pessoas provenientes das mais diversas classes sociais agem costumeiramente de modo grosseiro quando desejam saber da vida alheia. Todavia, aquelas menos afeitas à instrução, as desertoras dos bancos escolares, as sem leitura, cujo pensamento sempre considerou perda de tempo entreter-se, às voltas com a "miscelânia de palavras difíceis" escritas em folhas de papel. Essas invariavelmente demandam o uso muito menos frequente de cortesia e polidez. Perguntam sem rodeios a qualquer um:
- No que tu trabalha? Inquirem castigando a língua de Camões enquanto coçam a cabeça ou demonstram outro cacoete qualquer.
- Quanto tu ganha? Tu casou? Nenhum constrangimento tem efeito sobre esses duendes abusados.
Outro dia eu caminhava em direção a minha casa quando fui interceptado por um desses seres sem modos:
- O que tu faz da vida hein? Interpelava a mulherinha tôsca a minha frente. Permaneci alguns segundos calado olhando para ela. Imune a qualquer medida de ridículo ela fez nova carga formulando nova questão:
- Tu não vai mais pra Porto Alegre?
Novamente fiz uma pausa prolongada, controlei meu ímpeto de mandá-la á merda, disse-lhe duas ou três palavras e me despedi. Gente como aquela mulher estúpida acotovela-se nos batentes dos muros nos bairros da periferia e mede a felicidade pelo poder aquisitivo, ou o potencial de adquiri-lo. Possuem uma escala muito peculiar de avaliação onde cada objeto de consumo, obtém pela sua ordem de importância nessa escala, muita vez subjetiva, um número determinado de pontos a favor. Eletrodomésticos, carros, casas, viagens, financiamentos... Tudo conta pontos. E são considerados por essas pessoas pré-requisitos para a felicidade.
Sabedoras da assunção de beltrano ou cicrano a um cargo público via concurso, tratam de espalhar alvíssaras. Se os referidos forem militares recém ingressos no baixo oficialato, ou mesmo sentarem praça como subalternos, as futriqueiras propagarão notícias de bom alvitre decretando aos "felizardos" fama e sucesso. Feito isso, logo tratarão de especular a condição civil dos supracitados. Caso sejam solteiros, não lhes faltaram moçoilas casadoiras pretendentes.
E a vida seguirá seu curso no vai-da-valsa até o fim...